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Qual é a atitude judaica com relação a Jesus?
Por Michael Asheri
O judaísmo não deve nada ao cristianismo, muito obviamente, mas não é tão óbvio o fato de que o cristianismo não deve quase nada ao judaísmo. As duas religiões têm pouco, se é que têm alguma coisa, em comum.
Com frequência, não-judeus perguntam a judeus: “Qual é a atitude judaica com relação a Jesus?” A resposta honesta a essa pergunta é: “A atitude judaica para com Jesus é exatamente a mesma que a atitude cristã para com Maomé.” Esta é uma resposta precisa e um paralelo válido. Maomé apareceu quando o cristianismo já estava com diversos séculos de existência e afirmou ser o último dos profetas. Ele reconheceu tanto a Bíblia quanto o Novo Testamento como livros verdadeiros e tanto os profetas hebraicos quanto Jesus como homens santos. Contudo, alegou que sua revelação era a verdadeira e final, suplantando tudo o que havia acontecido antes. Isto é quase o mesmo que Jesus fez, ou pelo menos o que seus seguidores fizeram. Reconheceram a Bíblia, chamaram os profetas e as figuras da Torá de portadores da verdade, mas terminaram dizendo que sua revelação tornava as leis da Torá letra morta, porque a aceitação de Jesus tomava seu lugar. As declarações dos cristãos culminaram na doutrina de que Jesus era Deus encarnado, afirmação que ninguém jamais fez a respeito de Maomé.
É seguramente relatado que o Islã conquista mais convertidos a cada ano do que todas as religiões do mundo juntas, inclusive todas as seitas cristãs. Apesar disso, e apesar do reconhecimento de Jesus como um santo profeta pelo Islã, a maioria dos cristãos ficaria em posição difícil se tivesse de dizer em que ano ou até mesmo em que século nasceu Maomé. Essa atitude, com modificações no grau de conhecimento, descreve a visão que os judeus têm de Jesus. Sabemos que ele viveu e temos uma vaga idéia do que pregou, mas é só. A idéia disseminada de que os judeus, embora rejeitando a reivindicação de Jesus à divindade, consideram-no um grande mestre e uma grande figura moral é completamente falsa. Não aceitamos suas reivindicações e somos indiferentes a seus ensinamentos; simplesmente não estamos interessados nele ou no que disse, assim como os cristãos não estão interessados em Maomé.
Quanto ao Novo Testamento, os judeus que se deram ao trabalho de lê-lo descobriram estar em desacordo com grande parte do que ele contém. Quando lemos no Evangelho segundo Mateus, 8, 21-22: “E outro de seus discípulos lhe disse: “Senhor, permite-me que primeiramente vá sepultar meu pai.” E Jesus, porém, disse-lhe: “Segue-me, e deixa que os mortos sepultem os seus mortos””, mal sabemos que lição extrair disso. A idéia de que é possível a um homem salvar a sua alma deixando insepulto o corpo de seu pai é algo que a mente judaica é incapaz de aceitar. Dizer que o fim, neste caso a salvação da alma, justifica os meios provoca a resposta judaica de que um fim que emprega esses meios não é um fim que nos interesse.
Pouco sentido há em ir além nas doutrinas contidas no Novo Testamento, exceto para dizer que elas explicam, em grande parte, a assinalada falta de sucesso que os cristãos experimentaram em converter os judeus à sua religião. Na realidade, o paganismo dos gregos, em sua época, fez maiores incursões em Israel do que o cristianismo jamais foi capaz de fazer.
Quando os meus alunos nos Estados Unidos me perguntavam: “Devemos respeitar a religião de nossos vizinhos?”, minha resposta era: “Claro que não. Mas vocês devem respeitar seus vizinhos, e por isso não podem encontrar falhas na religião deles, porque fazê-lo seria desrespeitá-los como pessoas.” Uma vez que quase não existe um terreno comum entre o cristianismo e o judaísmo, apesar da divulgação de concepções errôneas em contrário, é provável que qualquer discussão de religião com os não-judeus seja uma perda de tempo, e os judeus são aconselhados a dela se absterem. A franqueza, em particular, pode facilmente levar a ressentimentos; há muitas coisas que é melhor deixar de dizer.
Por Michael Asheri em “O Judaísmo Vivo: as tradições e as leis dos judeus praticantes”, Imago Editora, 1987.
Michael Asheri é escritor e antropólogo.
